O NORDESTINO
O sol queima a terra
Fazendo, com o correr dos meses,
Com que desapareça a relva.
O gado começa a morrer.
E o nordestino está lá, não se entrega.
Vestindo seu surrado único terno
Parte para a missa,
Vai rezar ao seu padrinho Padre Cícero,
Sua única esperança de chuva.
Os dias passam,
A sua angústia cresce,
As lágrimas por vezes aparecem em seus olhos,
Mas ele continua lá, rijo, não se entrega.
Sua fazenda era tão bonita.
Cento e vinte cabeças de gado,
Porcos,
Galinhas,
Tudo acabou,
Restando apenas “Negrita”, “Macuca” e “Herói”.
Tudo é desolação.
Padre Cícero, onde estarás?
Diante disto só lhe restará
Aprontar os poucos que tem
E pegar o primeiro “pau-de-arara”
Que descer para o sul.
Não vale a pena lutar mais.
Agora dorme
Em sua tosca e quente cama de lona
Estendida na varanda.
A lua que há doze minutos,
Tão límpida,
Embranquecia todo o sertão,
De repente murchou,
Teve interceptada toda a sua luz
Por uma nuvem que veio carregando e peneirando
As águas que traz dentro de si.
Estala o primeiro trovão
E o nordestino sobressaltado,
Ainda sem entender a música destes pingos,
Desperta e corre para o campo aberto
Para sentir a chuva salvadora.
Viva o padrinho Padre Cícero.
Já não irá mais embora
Pois agora terá água para lhe matar a sede.
Dentro de mais alguns dias
Os campos estarão vicejantes novamente
O que lhes dará aquele colorido verde
Que ele um dia alegremente batizou como
O seu ouro.
Porém, choveu demais.
O rio começou a transbordar.
A fazenda do compadre Tibúrcio
Já foi tomada pelas águas de canto a canto.
O nordestino abriga ao compadre.
Procura acalmar a todos em casa.
Diz que a água nem chegará à sua cerca.
No fundo ele está inquieto
Mas evita demonstrá-lo
Para não atemorizar aos outros.
As águas continuam a subir.
Amanhã, por certo, já deverá ele abandonar o que é seu,
Renunciar ao fruto de tantos anos de trabalho,
Derrubar o castelo que erigiu com tanto cuidado.
É hora de rezar outra vez.
Padre Cícero, não mande mais chuva.
Bondade de Deus.
Hoje o dia amanheceu claro
Com o sol a brilhar tão intensa e alegremente
Que até parece querer
Recuperar o tempo perdido.
Alegria, alegria.
Continuará na sua fazenda,
Já não irá mais embora.
E virão novas secas.
E novas tempestades acontecerão.
E passarão para atestar
A grandeza,
A coragem e
A nobreza
Deste homem característico do Nordeste.
Nordestino, és sobretudo um forte.
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